quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Republicanos X Democratas - A história do impasse político americano



A mais antiga democracia contínua do mundo está em apuros. A polarização entre os dois partidos dominantes da política dos EUA há mais de 1 século nunca foi tão grande e tão prejudicial ao ambiente social, político e econômico da maior economia do mundo. O que se viu nos últimos 2 anos, com as idas e vindas da aprovação do aumento do teto da dívida americana, a longa batalha pela aprovação do novo sistema de saúde e a paralisação parcial do governo por várias semanas, tende apenas a se aprofundar, colocando em xeque o futuro da estabilidade democrática no país.


Hoje, se diz que o congressista democrata mais à direita está à esquerda do congressista republicano mais à esquerda e vice-versa. Isso, a despeito do maior grupo de eleitores do país (cerca de 35%-40%) ser o que se declara "independente" ou não alinhado a nenhum dos 2 partido, além do debate e polarização entre esquerda e direita estarem em baixa onde quer que se olhe ao redor do mundo.

Claro que, ao se tratar dos EUA, há de se relativizar o sentido que "esquerda" e "direita"  e todas as infinitas variantes ideológicas dentro de cada vertente (que podem ser tema para pelo menos mais outro post). As definições baseadas no senso comum do que boa parte dos americanos considera "de esquerda" ou "de direita" pode ser vista nesse quadro (para melhor visualização clicar no linn abaixo):



Como pode ser visto acima e nas principais pesquisas de opinião recentes, a divisão não ocorre apenas dentro do Congresso americano, mas em basicamente qualquer questão social de relevância. Em nenhum tópico importante há algo próximo do consenso. Desde temas como aborto, drogas e sistema de saúde até segurança, guerras e impostos, não há só um tópico que tenha menos de 40% de pessoas pró ou contra aquele tópico entre os eleitores.

Tal divisão se reflete no discurso dos candidatos e principais apoiadores de um lado e o do outro. Pode se afirmar que a iniciativa do fundamentalismo partiu dos Republicanos quando surgiu em seu seio o grupo ultra conservador Tea Party, com seu feroz discurso de crítica a toda e qualquer política que aumentasse os gastos do governo ou tornasse a sociedade mais liberal. Mas é fácil constatar que o lado democrata também não contribuiu em nada para a estabilidade do sistema, radicalizando também seus pontos de vista e evitando negociá-los. Com a Câmara de Representantes (similar á Câmara dos Deputados no Brasil) na mão dos Republicanos e o Senado e a Presidência na mão dos Democratas, aprovar toda e qualquer lei, mesmo por maioria simples, se tornou uma batalha, que não só ameaçou paralisar, como de fato já paralisou, o país em mais de uma vez recentemente.

Até na mídia esta divisão está muito bem caracterizada pela existência de jornais, programas de rádio e até canais de TV com claro viés republicano ou democrata. O canal de notícias FOX News se tornou feroz crítico de Obama, ao ponto de suas coberturas jornalísticas chegarem ao ridículo. Do lado liberal a MSNBC faz o contraponto da FOX News. Assistir a esses canais chega quase a ser uma experiência cômica, mas ambos tem audiências gigantescas, enquanto a CNN, que tentou se manter neutra vem despencando no "IBOPE" local.

Na mídia impressa, quase todos os grandes jornais se posicionaram de um lado ou de outro, apoiando abertamente candidatos. Hoje, é possível você ler, ouvir e assistir apenas ao lado pelo qual se interessa. Se você é conservador pode apenas se informar pelos meios de comunicação conservadores. Até aí, nenhum problema, todos devem ter a liberdade de publicar o que quiserem e cada um pode ou não acessar as fontes de informação que quiser. O que ocorre é que essa divisão clara apenas aprofunda os pontos de vista de quem já é crítico ou apoiador de um partido ou outro e relega o centrismo, o debate e o contraponto à segundo plano.

De quem foi a culpa da paralisação do governo americano em 2013? Provavelmente dos dois.

Mas nem sempre foi assim, até o começo do século passado o partido democrata era mais conservador e dominava o eleitorado no sul do país. Basta lembrar que Lincoln, considerado então um grande progressista, odiado pelos sulistas conservadores e responsável pela abolição da escravidão, era Republicano. Em especial a partir da crise de 1929 e do governo do democrata Franklin Roosevelt, o partido democrata deu uma forte guinada à centro-esquerda, tornando-se o partido progressista e de viés social-democrata nos EUA, enquanto os republicanos prontamente ocuparam o campo contrário. Desde então até o início deste século houve certa estabilidade e coesão interna dentro dos partidos, com claras diferenças ideológicas, mas em clima de debate e moderação. Desse modo o país conseguiu sair da crise e, após a segunda grande guerra, se consolidar como a potência hegemônica no bloco capitalista. Com o fim da União Soviética, da Guerra Fria e da "ameaça socialista", novos inimigos tiveram que ser encontrados e o foco da política se voltou para questões internas. Com a ascensão das novas potencias emergentes e a relativa melhora nas economias europeias (até 2008), o peso dos EUA na economia e nas decisões globais de diluiu e polarizou o discurso entre o grupo que achava que esse declínio relativo estava relacionado a derrocada dos valores econômicos liberais e sociais conservadores que tornaram os EUA hegemônico nas décadas anteriores e aquele que via a solução para tal declínio por meio da construção de uma sociedade mais igualitária e progressista, com a ampliação do guarda-chuva social e uma presença mais forte do governo na economia. O problema é que os dois grupos de distanciaram de tal modo que sobrou pouco entre eles para o debate.


Burro, símbolo do partido Democrata e Elefante, símbolo do Partido Republicano: partidos buscam novas identidades
         
Exemplo claro disso ocorreu durante a última eleição presidencial, no ano passado. Durante as primárias republicanas, o candidato escolhido para enfrentar Obama, Mitt Romney, chegou a ser acusado pejorativamente de "moderado" pelos seus oponentes dentro do partido, o que revela o descalabro da ideologia dominante entre os republicanos. Um republicano não consegue atrair votos dentro de seu partido se não provar ser um "true conservative". Apoiar a legalização da maconha? Nem pensar! Ser a favor do (já vigente há décadas) direito ao aborto? Derrota na certa. Falar em aumento de gastos para gerar emprego? Só pode estar louco. Infelizmente para Mitt Romney, mas felizmente para os EUA e para o mundo, as mesmas posturas que atraem o voto dos ultraconservadores afugentam os eleitores independentes (os que decidem todas as eleições majoritárias nos EUA) e os republicanos perderam outra vez. Romney tentou equilibrar-se entre a linha de conservador moderado e ultraconservador, mudando seu discurso ao longo do tempo e dependo da ocasião em que se encontrava. Quando conseguia convencer seu partido de que era a pessoa certa, perdia eleitores no centro, quando queria agradar o centro, perdia sua base de apoio.

Haviam pontos positivos no programa de Romney? Sem dúvidas. Mas os pontos positivos eram ofuscados por debates pontuais, muitas vezes caindo para o lado moral e religioso. Ficou fácil para Obama, que nem primárias teve que enfrentar, levar a eleição.


O que será então que irá acontecer com a política americana daqui para frente? O partido democrata tende a continuar vencendo as eleições, reconquistando o controle total do Congresso e mantendo a presidência? O partido republicano se tornará cada vez mais um partido provinciano, condenado ao sucesso nos rincões longínquos e zonas rurais onde ainda reina absoluto?

Sem dúvidas as perspectivas demográficas, econômicas e sociais são bastantes negativas para os republicanos tradicionais. Além de enfrentar a realidade de uma composição partidária muito mais diversa dentro de seus quadros internos (do Tea Party aos libertários) do que a democrata, os grupos que tradicionalmente votam no partido estão perdendo sua relevância dentro da composição geral do eleitorado. São os WASP (brancos, anglo-saxões e protestantes) que moram majoritariamente nas pequenas cidades ou no campo, no Sul e Centro-Oeste do país. Ainda há maior concentração de eleitores republicanos entre os homens, as faixas mais ricas e as faixas etárias mais avançadas.

Com o crescimento das populações urbana, negra, latina e jovem, o partido democrata tende a, se nada mudar, ganhar eleitores naturalmente e gerar um cenário onde uma vitória republicana em condições normais se torne quase impossível.

Composição do eleitorado republicano por categoria
Evidente que o republicanos já perceberam essa tendência há tempos, mas simplesmente ainda não conseguiram encontrar uma solução para reposicionar sua imagem. Uma coisa é certa: é impossível agradar os ultra-conservadores (cerca de 30% do partido) e não perder apoio de parte significativa dos eleitores independentes, como já foi provado nas últimas eleições. Há quem diga que, a cruzada para atrair o voto negro, jovem ou feminino é tão complexa e exigiria tanto esforço que a única solução viável de curto/médio prazo para que um candidato republicano tenha qualquer chance em 2016 é aprofundar ainda mais a liderança que o partido já possui nos segmentos onde é forte e incentivar um turnout (presença nas urnas) recorde dessas pessoas. Nada fácil também.

Por isso acredito que a solução, ainda que custe ao partido diversos revezes para notar, seja uma profunda mudança interna e uma forte guinada para o centro em questões morais/sociais, voltando o debate para a economia e a estratégia do país para os desafios futuros.

O problema da extrema-direita do Tea Party é que ela acredita que todas as soluções para os problemas atuais estão todas no passado, na glamourizada época dos "founding fathers" ou na Era de Ouro dos EUA. Já para a extrema-esquerda, a solução e o mundo ideal estariam em um futuro atemporal e inatingível. Mas os desafios de hoje não são os do passado e nem os do futuro.

Faltou aos políticos americanos perceber que o mundo a sua volta mudou e os EUA não reinam mais hegemônicos como a única grande potência e que aquela época dourada passou para nunca mais voltar. Em qualquer um dos casos, o que falta é olhar para o presente e seus gigantescos desafios. Isso ou a maior democracia do mundo continuará tropeçando e ficando de joelhos na mãos de extremistas. E quem perde é todo o mundo.


sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Mensalão e o futuro da política nacional

Caros leitores,

fui convidado pelo Vinícius para contribuir como o Fora da Esfera e aceitei com prazer. Meus textos também abordarão todos os tipos de temas e comentários são mais que bem-vindos.

Começo o primeiro post, comentando sobre o resultado da Ação Penal 470, mais conhecida como Mensalão, que há pouco teve suas primeiras prisões decretadas e causou profunda comoção em nossa sociedade.

Acompanhei o caso desde o começo, em 2005, quando a Folha de São Paulo divulgou a entrevista em que Roberto Jefferson revelou o esquema. Acompanhei também a CPI e as cassações subsequentes. Ano passado, também segui de perto o julgamento, acompanhando boa parte de suas sessões o na íntegra e lendo toda sorte de comentários e análises, de ambos os lados da moeda.


O caso

Em 2005, o Ministério Público acatou a denúncia do Mensalão. Resumidamente, o esquema envolvia empresas estatais, bancos, empresas de publicidade chefiadas por Marcos Valério e deputados e políticos petistas e da então Base Aliada ao governo.
Segundo a denúncia, estatais contratavam as empresas de Valério por meio de contratos publicitários aparentemente lícitos (por se tratar de uma estatal, com dinheiro público) e, com as garantias desses contratos, Valério obtia crédito junto ao Banco Rural e o BMG. Parte desse dinheiro era então repassado para o Partido dos Trabalhadores, que o teria utilizado para pagar dívidas de campanha e comprar, rotineiramente, apoios de parlamentares e partidos a fim de garantir maioria nas votações do congresso (daí o termo "mensalão").
Roberto Jefferson em 2005: beneficiário e delator do esquema, terminou cassado

Entre os articuladores do esquema estariam também o então Ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu e o presidente do PT José Genoíno e seu tesoureiro, Delúbio Soares, que não teriam se beneficiado financeiramente do esquema, mas o coordenado.

A reação incial foi de aparente surpresa. O então presidente Lula deu uma famosa coletiva de imprensa e cedeu uma entrevista em Paris, em que admitia o esquema e se dizia "traído" (links ao final do texto). Dirceu foi retirado de seu cargo no Ministério e teve seu mandato na câmara caçado (assim como Jéferson e outros deputados acusados de receber o dinheiro). Genoíno e Delúbio foram afastados do PT. A oposição chegou a considerar entrar com um pedido de impeachemnt do Presidente Lula, mas apostou que seu desgaste com o caso levaria a uma inevitável derrota nas eleições do ano seguinte, o que não aconteceu.

Lula foi bem blindado, o partido preferiu sacrificar os demais acusados no caso para salvar o presidente e a estratégia deu certo. Por mais improvável que fosse a afirmação de que Lula estava alheio à existência do esquema comandado pelo ministro mais importante de seu governo, esta versão "colou". A falta de provas substanciais/materiais contra o presidente (e mesmo contra Dirceu) fizeram com que seu nome não fosse incluído no processo.

Possibilidade de Impeachment de Lula chegou a ser ventilada por parte da mídia e pela oposição

Lula foi reeleito em 2006 e elegeu uma sucessora sem dificuldades em 2010.


O julgamento

O caso ficou esquecido até o ano passado, quando em fim, o Supremo Tribunal Federal inciou o julgamento do processo com a relatoria do Ministro Joaquim Barbosa. A presença de ampla maioria de juízes indicados pelo PT na formação do STF, o histórico de impunidade de suspeitos de corrupção e a falta de histórico de julgamentos penais (ainda mais um com 38 réus!) na história do Supremo, eram desde o princípio motivos fortes para se acreditar que o julgamento acabaria em "pizza". Os condenados tinham absoluta certeza de que seria absolvidos (entrevista com Dirceu no Roda Viva antes do julgamento nos links abaixo) e a opinião pública via a possibilidade de condenação com desconfiança.

O então Procurador Geral leu a denúncia, contando a história que todos já sabiam. Em seguida, os advogados de defesa apresentaram seus argumentos. Muitos deles não afirmando a inocência de seus clientes, mas argumentando que o dinheiro que receberam/forneceram foi usado exclusivamente para financiamento de campanhas políticas e pagamentos de dívidas (o famoso "Caixa 2") e que, por ser um crime que já havia prescrito, seus clientes não poderiam ser condenados por isso.

Os advogados basicamente admitiram que houve crime, mas que ele era menos grave do que o apresentado na acusação, por se tratar de uma prática comum na política brasileira e que não implicava em corrupção.

Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski, relator e revisor do processo: divergentes em quase tudo

A maior parte dos ministros do STF rejeitaram essa tese. O núcleo financeiro do esquema (diretores dos bancos e estatais envolvidas) foram condenados de maneira praticamente unânime. Provar que o dinheiro foi obtido e utilizado para fins ilícitos não foi tarefa difícil. Marcos Valério foi condenado por todos os crimes pelos quais foi acusado, inclusive o de Corrupção Ativa, o que já implicava que deveriam haver punições por Corrupção Passiva, uma vez que se há provas de que um lado foi corruptor, outro certamente foi corrompido. Esse primeiro round de condenações deu alento à opinião pública, pois seria quase impossível os ministros do STF não seguirem essas primeiras condenações com as do núcleo político do esquema.

Nas sessões subsequentes, a maior parte dos deputados acusados de receber os repasses foi condenada (inclusive Roberto Jéferson, que não conseguiu se beneficiar da delação premiada) e restou a análise dos 2 réus de maior importância, José Genoíno e José Dirceu, contra quem não constavam provas materiais de envolvimento (o que é de se esperar de um esquema de corrupção minimamente elaborado), mas apenas provas circunstanciais e depoimentos. As condenações de ambos vieram, após algumas das sessões mais longas e debatidas de toda história do Supremo. Por fim, a maior parte dos ministros considerou que, pelos cargos que ocupavam e pelas circunstancias descritas no caso (o tal "Domínio de Fato", as acusações eram cabíveis e ambos foram condenados.

A reação

Surpreendemente ou não e, após assistir incrédulo a condenação de 2 de seus maiores líderes históricos, o PT divulgou notas indignadas, defendendo a inocência dos réus, uma reação contraditória considerando o que vinha sendo dito antes do julgamento.

Marcos Valério se entrega à PF no DF

Juristas se posicionaram, alguns discordando, mas a maioria concordando com a maneira com a qual os ministros do STF julgaram o caso. A maior parte da mídia ficou claramente ao lado dos ministros que votaram pelas condenações, glorificando o relator Joaquim Barbosa apesar de seus excessos durante o julgamento.

Entre as principais críticas, cabem esclarecer 3:


- O julgamento foi realizado por um tribunal de exceção

A Ação Penal 470 seria "um ponto fora da curva", dizem alguns defensores dos réus e incontáveis porta-vozes informais do governo. Nunca antes na história o Supremo havia julgado uma ação penal dessa magnitude e condenado políticos. Em outros casos recentes de corrupção, o Supremo sequer se pronunciou. Como escreveu Demétrio Magnoli para a Folha: "Mas, se assim for (o julgamento for um ponto fora da curva), que o 'ponto' inaugure uma nova 'curva', traçada por um compasso que não reconheça privilégios derivados do convívio nos palácios." 

As condenações penais por corrupção precisavam começar no Brasil.  Que esse caso, por todo sua gradeza e simbolismo seja o primeiro de uma nova era onde a impunidade acabe.


- As condenações foram de caráter político

Com a composição do Supremo recheada de indicados pelos governos do PT é quase inacreditável que esse argumento seja utilizado para desqualificar a corte. As condenações foram baseadas em provas materiais e circunstanciais e o amplo direito de defesa foi e esta sendo garantido (ainda restam os embargos infringentes).


- As condenações de Dirceu e Genoíno foram injustas, porem terem sido proclamadas sem provas

Como citado anteriormente, algumas condenações se basearam nas condições e circunstancias em que foram cometidos os crimes. Como também lembra Magnoli à Folha:

"Os integrantes do núcleo político do 'mensalão' foram condenados sem provas, por um recurso à teoria do domínio do fato, alegam ali (no PT, em sites chapa-branca financiados com dinheiro público) e aqui (neste espaço, por comentaristas que não se preocupam com a duplicidade de critérios morais), numa tentativa canhestra de confundir o público. A teoria do domínio do fato, amplamente utilizada nos tribunais brasileiros, não equivale a uma noção arbitrária de 'responsabilidade objetiva', que é coisa de tiranias, e não dispensa provas. Ela é uma ferramenta analítica destinada a identificar responsabilidades em crimes cometidos pelo concurso de agentes: no julgamento de uma quadrilha de assaltantes de banco, serão imputadas penas não só aos que empunharam armas, mas também aos planejadores da ação. Sobram provas nos autos do processo do 'mensalão'".

Não há constatação empírica de que Genoíno tenha enriquecido com dinheiro ilícito. Seu padrão de vida é compatível com sua renda como parlamentar. Contudo, o núcleo político petista que coordenou o mensalão não executou o esquema com fins de enriquecimento próprio, mas almejando perpetuar o projeto de poder de seu partido e seu governo. O objetivo final do esquema para o PT era estabilizar e reproduzir um sistema de poder e perpetuá-lo o máximo possível. Corrupção de qualquer maneira, crime ainda assim.


Análise

Por envolver altas lideranças da República e a compra da consciência de parlamentares (representantes diretos do povo) o escândalo do mensalão se coloca, indubitavelmente, como o mais grave caso de corrupção descoberto desde o restabelecimento da democracia. Apesar dos valores relativamente pequenos envolvidos nas transações do esquema, sua natureza política e seu simbolismo o colocaram em destaque. Não é ousado demais imaginar que em uma democracia mais desenvolvida e com tradição de punição a corrupção, o governo tivesse caído e os partidos envolvidos severamente punidos, possivelmente sendo levados a extinção. Em nosso país, o descrédito geral dos partidos e a generalização da corrupção acabam beneficiando justamente quem prática os mais nefastos atentados contra a gestão pública. Em uma terra de ladrões, a solução é votar em rouba menos, ou mente melhor. 

De mesma maneira que os protestos contra o aumento das passagens de ônibus em São Paulo, nos levou a um movimento nacional, muito maior e mais abrangente. Que o exemplo e a jurisprudência legados do Mensalão iniciem um novo movimento de moralização da atividade política e enfim o restabelecimento da confiança popular na gestão pública.

Manifestação toma o Congresso Nacional em junho de 2013

Links:

Infográfico do UOL:

Roberto Jefferson fala ao Conselho de Ética da Câmara (2005): http://www.youtube.com/watch?v=-ltOPtpAx_c


Discurso de Lula na Granja do Torto (12/08/2005): https://www.youtube.com/watch?v=Qj-w3i9_hpQ

Defesa de Roberto Jefferson no plenário (15/09/2005): http://www.youtube.com/watch?v=MolZMvTc3TA

Entrevista com o atual Ministro da Justiça José Eduardo Cardoso (2010): http://veja.abril.com.br/200208/entrevista.shtml

José Dirceu no Roda-Viva (01/11/2010): http://www.youtube.com/watch?v=wga4YSFyQYE

Lula no NY Times (2013):

Nota do PT emitida no dia das primeiras prisões (15/11/2013): http://www.pt.org.br/noticias/view/nota_do_pt

domingo, 1 de dezembro de 2013

Porque a China tem um assento permanente na ONU e a Alemanha não?


Por que a China é membro permanente do conselho de segurança e outras potencias como a Alemanha, Itália, Japão não são?

Além disso, o que significa ser membro permanente do conselho de segurança?


Organização das Nações Unidas

É no mínimo intrigante pensar que a China, um dos países mais pobres e miseráveis até pelo menos a década de 1990, estava no mesmo patamar de poder do que EUA e URSS, por exemplo.

Para entendermos como responder a primeira pergunta acho interessante olharmos para a segunda.
O conselho de segurança da ONU é o órgão máximo da organização, que toma as decisões mais importantes como autorizar missões diplomáticas e de paz ou até autorizar intervenção militar.

Conselho de Segurança da ONU

Atualmente o conselho é composto por 15 membros, dos quais 5 tem assentos permanentes e 10 são rotativos, trocam a cada 2 anos.

Os países que possuem o assento permanente são: EUA, Grã-Bretanha, França, China e Rússia.
Toda decisão precisa da aprovação de, pelo menos, 9 membros. A grande questão é que qualquer um dos países com assento permanente tem poder de veto. Isso significa que mesmo que 14 membros votem a favor de uma decisão, ela será valida se um dos países com assento permanente votar contra.

Claramente o veto é um enorme poder nas mãos desses 5 países, que não são exatamente aliados, o que gera impasses como a intervenção na Síria, requisitada pelos EUA e vetada consistentemente pela Rússia ou qualquer intervenção mais forte na Coréia do Norte, vetada pela China.
Charge do Kal: Intervenção na Siria - Fonte: The Economist

Para entender como os assentos permanentes de segurança foram definidos voltamos até o final da Segunda Guerra Mundial, quando os países aliados, principalmente os EUA e Grã-Bretanha, chegaram a conclusão que a antiga Liga das Nações, apesar de ser bem-intencionada, falhou em ser um órgão mediador e mantenedor da paz mundial, já que não evitou a ascensão nazista e a Segunda Guerra Mundial. No lugar dela decidiram criar a Organização das Nações Unidas, a ONU, que funciona até os dias de hoje.

Porque a Liga das nações não funcionou e quais as diferenças da ONU são assuntos para outro post

Na Segunda Guerra os principais países aliados que venceram a guerra foram: EUA, França, Grã Bretanha, URSS, além de vários outros países menores que também contribuíram para a derrocada nazista (inclusive o Brasil).

É natural pensar que esses países seriam os controladores da nova organização mundial, já que haviam ganho a guerra. É curioso notar que a URSS e os EUA estavam do mesmo lado durante a guerra e passaram a ser inimigos antes mesmo do fim do conflito, o que ocasionou o período da Guerra Fria, também natural é o fato de que a Alemanha, Itália e Japão foram deixados de fora, já que estavam do lado perdedor.

Mas ainda fica a dúvida, porque a China foi incluída no grupo?

Sim, a China participou da guerra ao lado dos aliados, mas serviu mais como saco de pancada japonês que outra coisa. Quem venceu a guerra do Pacífico foram os EUA (que quase perderam para os japoneses).
É verdade que os chineses sofreram muito nas mãos dos japoneses, com milhões de mortos em decorrência da ocupação, mas isso não justifica o assento, já que diversos outros países sofreram o mesmo ou mais, como a Coréia ou a Polônia.


Invasão japonesa da China

A questão é que a China era o único país da Ásia, além da URSS, que poderia fazer frente ao Japão, assim pensavam na época e é por esta razão que ela ganhou o seu assento.

Você pode se perguntar se faz sentido os EUA, Grã-Bretanha e França,  entregarem tanto poder para um país comunista, mas não foi bem isso o que aconteceu.

Até 1971, a “China” que detinha o assento permanente não era a República Popular da China (mais conhecida como China ou China continental) e sim a República da China (mais conhecida como Taiwan), a confusão vem porque as duas se consideram “a” China. Por volta dessa ano a China comunista rompeu ligações com Moscou e adotou uma política própria, fazendo com que os EUA buscassem se reconciliar com este governo. Com essa mudança o número de países que reconheciam a China continental como a “verdadeira China” superou os que reconheciam o governo de Taipei, fazendo com que o representante de Beijing tomasse o assento permanente, com todo poder e influência que ele traz.

Atual representante chinês na ONU - Fonte: News.CN

É por causa desses percalços e “detalhes” históricos que a China comunista, e não a Alemanha, Itália e Japão, está no Conselho de Segurança da ONU.